20120928

colagem vespertina # 1



esta noite estarei no paraíso
através do mesmo baldio
e suas treliças de claridade

inexata fé
vivente onde quer
amar indiscrimanadamente
o brevíssimo beco

para cada voz
tua boca
entoa alucinada
estrangeira como pedra o sexo
de luz incidindo nas beiras
de uma pintura negra:
teu anjo
de engenho e rigor
outro mistério aquém
deixa vivo

ó infanta de olhar maiúsculo
engolindo o levedo
da amêndoa



20120921

sexta-feira branca



este o nome da sorte: o enlace do nada, chamado-amor
ele que vem dentro de um véu de nada
a boca e os olhos são buracos e me beija o vazio
(como beijará a Hilda) (os amantes)

a morte poderá ser um ramalhete invertido, descendo à terra
(quantos dias à espera do ramalhete? dois?)
mas a rainha de espadas, driblando e ajeitando o seis, guarda de seu futuro a beleza ainda
ramalhetes também os deixavam os ciganos ao longo da longa via da longa viagem para sinalizar
passagens, ao longo da costa, o navio partiu, ou dizem que vem chegando o navio

(nesta noite conheci piratas que sufocavam naus perto do Marrocos - eu nado muito, mas as ondas não se movem, apesar de haver ondas), na carta me lembro de Aladim e de como eu gostava dele
_ Terra à vida, Mar à vista _
para onde eu vou? o meu número da sorte é 6,
o que nos entendimentos constelados pode querer dizer: faz do teu corpo teu lugar de beleza, repousa no teu corpo, faça música no teu corpo, dedique-se a ter água por dentro do pensamento.

e chegamos a Cubatão. à pira de Aquiles. ambas as piras, a do sangue e a mortuária. qual tua escolha? vida longa ou destino heróico? mas estas não são escolhas que se façam à literatura. nenhuma.
morte, morte, morte, história de família. herança. meu homem. o de cara vazia. que me beija a boca.

vem número 8, número 9 de ouros, vem palavra baça e felpuda
transmuda o metal em mel
dourado

abelha-rainha
(tu, dioniso)

20120920

para o dia 20, esta quinta-feira, até que enfim, nuvens de espadas, conforme o cinza dos avisos






bueno, segue-se entendendo assim:

9 de espadas, o 35, recado do mar, tripé de se adentrar na terra, vá minha filha, que o navio tem tempo e te espera _ faça seu passeio (trabalhe)
------- carta interrompida, o número 1, com o bigodudo de espadas (por hoje: só espadas), te avisa: cuidado com a mulher risonha (que eu já leio, a tal da cachaça) (invertida) (invertebrada) (compreende?) ela te acerca com cara risueña, mas é de espada
8 de espadas, ramalhete de afinco, sequencial concentração: vá menina. ao dia. e fique bem dentro disto tudo, ancorada.

35 + 9 + 1 + 8 = 53 = 8

(dedique-se, entendido & inventado: lido)
(que saturno vem antes e depois) (e vem faceiro) (dando trigo e pão na boca) (suculento)

20120919

para dia 19 de setembro, com lua escorpiana e calor, após brancos lençóis de calma e muito trabalho adelante






1 de espadas, 29 anos de espera e donzelice, trevo de cravos no azul do desejo (A HORA)
- carta do meio - interrompida - a promessa de um nascimento tumultuoso (e qual não é?)
preenche o 3 com moça criança e cabra e pequena casinha com bacia e água fresca (e trabalho)
cavaleiro de ouro, 10, o moço dos engenhos, saturnino, campestre, é ele quem vem (e trabalho)
(mas agora é siesta, pequena festa matutina, sombra do arado, durma e coloque a plaquinha enquanto dorme: que estou a trabalhar) (rêves, rêves, rêves)

29 + 1 + 3 + 2 + 10 = 45 = 9  (3 x 3) (É A HORA)
...

tudo me leva a crer que SATURAÇÃO DE SATURNO está prestes a nascer (não te parece?)

e sendo que vem vindo, abre-se poema para esta manhã de quarta-feira, oya

(poema que também está aqui, na coleta dos magos de mallarmargens, veja) 






apoteose

enquanto contemplava
o rebento rosa
entre os dejetos boiando
naquela tina de sangue

dois dedos na garganta
e desfaz-se uma noite
e desfaz-se o corruptível

dois dedos e uma unha
a menos o pé roxo e torcido
- alabama - desfeita
a casa acorda

contempla
esse pedaço rosa
encarniçado esculpido
gruta afora

retiro-o do vaso, repito
a operação pego-o com o dedo
o mesmo esperando
reconhecer

há outro roxo no antebraço
uma cara cada vez mais lua
enquanto míopes
as contemplações
oferecem-se ao fluxo
então contente espiralado
enfim lisonjeiro

recém-nascida por dois dedos
e uma máquina

faço tudo ficar branco
ficar claro, digo, franco

e sem memória

20120918

para começar o dia 18 de setembro de 2012, com vela de mel acesa após confusões oníricas e muito trabalho adelante


6 de paus, 36, crucifixo ouro esmeraldino, sina-sinal
cavaleiro de paus, 11, irukerê e feixe de gravetos (vassoura), abrindo-terreno, fechando-corpo
rei de copas, 24, coração ardente endereçado-convite de amor

36 + 11 + 24 = 71 = 8

20120906

revista córrego 4 ___________ M E D E A, sangue, notas botânicas


veio em agosto o n. 4 da revista córrego, editada pelos poetas gabriel kolyniak e tomás troster
está lindíssima, chegou em seu formato, feito, feita

entro nela com excertos da M E D E A, aquela ópera em preparo, aquele lento extermínio

sempre dedicado a maiara gouveia e ana rüsche, tríade de tecer vespas e outros animas de incêndio

eu tenho um carinho especial por este trabalho que espera, agora, repousando impresso em páginas negras, à espera, alquímico

há diante de mim uma prateleira inteira com o tema da pesquisa 'medea', coisas como "Histoire de l'alcool", "Ondina", "A botânica oculta de Paracelso", "Ditirambos de Dioniso", "História noturna", "O martelo das feiticeiras", "O segundo sexo", "A arte de jardinar", "A violência e o sagrado", e vamos...

tudo me espera, nos atiça, carmina _ um poema que entorpeça, sabe-o ela, medea

não a assassina, mas a estilhaçada pela paixão, aquela que à espera dedicou-se e quando depois de uma noite inteira se levantou, havia o ermo, o delito, o engano

e essa que chamo. essa sem medo.







20120904

júpiter e saturno dela






e só agora
caída como uma marciana
(dos quais ela entende bem)
vim dar ao júpiter, saturno

...


!


...

adorei, ó ana pands. quase entristeci de alegria, 
é muitas vezes assim que eu sei que gosto tanto de uma coisa
quando você se vê tão cativo
que exaspera um suspiro quiçá triste
mas daquela tristeza tão alegre de pertencer


não conhecem júpiter, saturno?


é por aqui. 







20120903

relendo a história da sexualidade _______ poema de 'fio, fenda, falésia' ________ lembrando HH






relendo a história da sexualidade



sentir-te volumosa a fincar resquícios –
faço fim da surdez se me permites em trégua
nua o que renasce poesia, conto a ti:

bastam sopro e riso – e desmemoria
basta erguer-se a imagem fremente
daquele mosteiro de encanto e provações:

releio a história da sexualidade
um lugarejo surpreendido –
houve mulheres, séculos a fio
irmanadas na impoluta volúpia    
                                               de cegar dejetos, a querência
                                               dos fantasmas

(se exilaram
por dentro)

                         de ordens e regras monacais
                         o corpo um sólido montanhoso
                         pés enterrados e vegetativos –
                         loucas por deus

trespassada a dádiva – a dúvida
espalham para o alto a extensão do conhecido
e nomeiam de não-dito a valência das imagens
aquilo que o deus não safou – úmido,  pertencido

depois: noites baixas
exaustas de orar, lidadas
abraçam-se nas masmorras, lã
sob o mesmo puído feno lençol 

o tentado – o senão:
animais diários, afilhados da oração
               
                e no mais singelo meneio
                o tato fala o deus

                e o fragor da noite suave aflora
                o junco do desejo

e descobrem
real o mistério que apalpa

e nesta alfombra de acolhimento
e enlaço, o percurso à densa parte
reabrem – no tronco – o deus
cheio de lanhos, natural











                                     


                                                         a sensação de que o sexo só é real
                                                                                                     na infância








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escrito em amizade com Renata Huber e Érica Zíngano
/ ProAC / SP / 2010

ESTE POEMA
que sempre me lembra algo de Hilda)

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20120902

Z, de Antonio Maria Lisboa


neste domingo solar, para os queridos da CASA DO SOL, 
Olga, Jurandy, Daniel e também para Daniel de Andrade






Z


As formas, as sombras, a luz que descobre a noite
e um pequeno pássaro

e depois longo tempo eu te perdi de vista
meus braços são dois espaços enormes
os meus olhos são duas garrafas de vento

e depois eu te conheço de novo numa rua isolada
minhas pernas são duas árvores floridas
os meus dedos uma plantação de sargaços

a tua figura era ao que me lembro
da cor do jardim


(António Maria Lisboa. Poesias. Lisboa: Assírio e Alvim, 1995)