20091111

escrivã








A primeira palavra que vem é
magnólia
ou então um embaraço, minha sujeição


Tento observar o vago vocabulário vindo dessa noite limada dos comprimidos
Essa noite em que se experimenta uma vez outra o exército flamejante do vazio

E não seria sincero dizer vazio, daí a magnólia
Palavra propícia entre o toldo anafilático disso que se quer dizer

Um cordão
Uma corda bem bamba
Famigerada e alucinatória
Cheia de dispersos tons e dispersas reclamações


Escritora não
Uma mulher a escrever
Bifurcando o não-sentido do talvez
Equilibrista com gaze nos joelhos
Esta anfíbia clorofilada em jejum, esta moça


Esta toda enfeitada de vermelho
pra dizer adeus


Não rumino ainda as ciladas? Fica absorto
Posso até dizer a primeira pessoa aqui um sujeito qualquer
um índice de início e linha, magnólia
minha sujeição

Entre tropeços e poças d'água
A geografia em degredo
O corpo cheio de mágoa
A mágoa cheia de medo
A memória em desalinho

Parece um verso qualquer
Querer dizer qualquer coisa nesta data
Parece um remorso um
Redemoinho


Uma gratuidade


Mas não é








20091013

nublagem

as ondas, virgínia
como ela a ana c. assinava
assassinada: virgínia lobo

acordei saudosa hoje
revi as pessoas mortas

com uma cripta na garganta

temor de intervenções
esquecer os carrosséis
doar os órgãos

minhas queridas
ez e re
erroez

acudam
minha
madrugada

20090818

para um amor no recife

sos escrito a fluídos
na borda do lençol

esta noite deixei que os líquidos
fugissem das grutas e caminhassem
por alguma trôpega linha
e te alcançassem num feroz
sonho dilacerado

estou aqui
vertebrada, nas tremas
de um suor triste
deitada para sempre

aqui bordando com bactérias
minha carta
querendo chegar no umbral
de tuas dúvidas, andentrar
densa os teus canais mais difíceis
e me camuflar outra vez
numa certeza de amor

20090817

(práticas)

todos os outros que se atentem ao bem

falar a língua

intimada a servir

quem lhe proíba

nua insandecida desço

à noite

numa sede nauta de desvios

e marulhos

vaguidão líquida que me lambe

e me consente

diamantes

mosaicos desta pura deslealdade

este lábio de amante

este elo de sangue falso

puro flash pura

mordomia

20090807

espaço maranus






caros, queridos,





convido-os todos a conhecer o espaço de cursos e de atendimento astrológico que montei, em são paulo.





a programação de setembro já está disponível!





abraços fortes,


roberta


http://www.espacomaranus.blogspot.com/

20090719

sketches ------------------- off hand para Ana C








aos vinte e oito vejo-a na sala

é minha a casa, não está desconfortável

toca um ensaio destes
destes
que você imagina quando se senta
e quando então está
acompanhada

é mais
nós sabemos, aquele
puro açucar, amamentações
carinhas plásticas de menina
com furos na boca
meninas fáceis de perverter, eu

penso que você saberia
como segurar essa boca aberta

apoiada no buraco do alfinete
você não abre a boca
não está dizendo coisa alguma
já faz whisky com bar
e já deixou cair pelo chão
guardanapos e rabiscos
técnica e mentira









20090711

Resgates - No mergulho às avessas, de Andréa Catrópa




I

Menina, aquele prédio de santa
Cecília, arruinado

você plantando ervas na sacada
tamanho tinha de nossos pés. O prédio era
azul e branco: você sempre dizia
quando chorava seco sem sua máscara de dormir

me pedia o sexo
sem palavras depois
me pedia o dia

quando eu voei você amaldiçoou
bela como uma bruxa

amor, foi você quem
me jogou pela janela.






AMARELINHA NO CURRAL

Pretinho soltava as rédeas
Gerusa fazia trança no rabo e nas crinas
Lajedo latia
Melissa galopava sem sutiens
Ricardo era um pássaro proibido
Deborah ainda não era gorda
Maria estava branca em sua véspera
de morte

Rosa não era uma máscara, ainda,
e nem seria




MEU AMOR I

mitigada sucessiva
mulher-às-beiras
de vidraças encardidas
pega paninho e
inseticida
faz carinha quando vê uma
barata
esmagada entre os dedos
de seu pé direito
- quer morrer –

não não quer, quer mesmo
que se conte a ela tudo todos
os crimes todas as jaulas
as mais adocicadas

quer mesmo é ter o álibe
de uma ou duas
ameaças

para quando a invejada das gentes
um dia lhe deixar

só a carcaça

20090709

as escolhas afetivas

três poemas meus, 'cante gitano', publicados no

www.asescolhasafetivas.blogspot.com


deixo aqui meu agradecimento ao Renato Mazzini, pelo cuidado e carinho.

20090624

Revista Desassossego

Caros,




É com prazer que anuncio o primeiro número da Revista Desassossego, confeccionada pelo Departamento de Literatura Portuguesa da USP. Há diversos artigos interessantes, nesse primeiro número, cujo tema editorial é, obviamente, Fernando Pessoa. Há ainda, uma entrevista com o escritor e professor da Universidade do Porto, Pedro Eiras, feita por Érica Zíngano; uma entrevista que eu realizei com o Prof. Paulo Borges, diretor da Revista Nova Águia, sobre cultura e lusofonia; além de poesia e ficção inédita.
Espero que gostem!

http://www.fflch.usp.br/dlcv/revistas/desassossego/index.php


abraços,

Roberta

20090615

litúrgica nas casas

à morte de ana


taturana murta, levemente ácida, um minuto
muito ávida
ao meio de nós uma dicção
de sinastrias ao meio
cuidado - telepatia muda

ela ávida muito afoita
a comer chocolares
de pé na canoa os canais
clarabóias

boca de mina
olhos tombados elétricos
arpoadores - primeiro
a tentativa pela água

não:
fiel só à ventania
léxico-cálice desbunde do destino
: a concha arrolada
pelas parcas
escadarias

20090610

tarde (de)liberada







Induzia-me os caminhos
Google-O-golem,
e me troçava a cara:


foco e sinopse, circuncisão
Valores familiares, teoria da cons-piração
life coaching mais sagrado do que você
cabelo e controle de armas alegação
de seqüestros por alienígenas

assim como
indução de falsas memórias, o criacionismo
disfarçado como ciência
com o nome de design

o que pensa?

o seu cachorro pensa?
legalização da maconha, a reciclagem
realmente vale
a pena? Farsa
piratória do Apollo 11, onde ficavam
as torres gêmeas continua sem destino
certo


fumo passivo, sexo sexo sexo

feng shui ou água engarrafada
gripe dos porcos ou
ESCOLHA AGORA
sua namorada
auto-sem ajuda, sansei-nos-acuda, coma
isto, histeria ambientalista, como aparecer
linda
nas revistas, pulsites, ao seu analista

isto
tudo
de pedra pane e perda
na pequena tigela de um nome
jogado a esmo na tarde das telas:

“ bullshit ”


America’s citycom including talk
Que-atua-para-desmascarar-aqueles
51% dos americanos que-acreditam-que


coisas


inexplicadas




são causadas por terroristas

ou fantasmas

pequeno diário parte um


repente-raio réia assim mesmo: o tornozelo doído, como se ligamentos estirados, o quê o quê? urano QUADRADO marte e netuno natais, pega ascendente, pega descuidos excessivos, outro QUADRADO entre plutão e júpiter natal, a morte passeando pelos estudos, tensionando a energia voluptuosa da organização, libra-capricórnio, cuidado com os ossos, é hora de ler aqueles manuais de saúde astrológica, registro.

um tornozelo direito. trânsitos, lua-lilith irmanadas quase na cúspide maior. aonde se encontra o destino. e ele segue seu passo, ainda no meio-metade do caminho, ele vem acariciando meus ossos, lento, preciso e vestido de escuro. a obra em negro. o começo real da alquimia, os 29 anos.

braços bem abertos
suponho

um jeito próprio de encomendar a sua vinda,
ó ceifador dos hábitos
e medos

20090609

Mira Myra
















Mira, o maravilhoso maravilhar-se


imagens das mãos no barro, dessa lunária plena, que me deu o vaso, o corpo


onde eu recolho, anuncio e distribuo minhas lágrimas e meus orgasmos




o que está a vir, dor-prazer tão irmanados,


lacrimatórios, enócoas


meu livro em breve que virá, pelos cuidados de Ricardo Pinto de Souza


e da Oficina Raquel




antes: deliciem-se com esta jarra


que acolhe todo líquido e depois


jorra na terra

ara








Mira, carinho imenso


sempre.






20090603

póstuma


2 de junho, ontem, carta que te desmembro e
planto
em territórios alagados
com um beijo de muita morte
a circular pelas palavras
querida Ana
inventada por/para mim
...

DEDICATÓRIA EM LIVRO DE PÓ

era dela o dia
o nosso abraço a virar espiral
as lanças de hera gotejando
açucares e libélulas e pimentas
ascendentes
como a seta no horizonte
esquerdo

era dela a linha
escrita declinada nas páginas
da sublimação
minhas foram depois
o que no princípio era
o amor
dado com carta burilada
em mesuras, com diâmetros
e virgulas a estiletes

nosso era o osso
pélvico
que muitas vezes rasgava
roxo o tronco remexido
da outra
(gineta monógina)

nosso era o fosso
de uma asa sem meta
pura estripulia de gigantes
ardilosos
nosso era o aço

mas dela era o dia
dela era a linha
minha uma pá-
gina uma

aporia








20090526

POESIA SÉCULO VINTEEUM OU ESTA NOITE DORMIU-SE MAL E ASSIM SE LEVANTA PARA UM CAFÉ FRIO MAS CHEIO DE ILUSÕES







Assumido

nunca mais o estalido e a rima
assim com laranjadas véus tonéis
- almas -
maciezas subterfúgios umbrais
nunca mais esse lustre vocal
essa odalisca que se repete em tantos
vasos venéreos de chocar
chorar e enócoas em geral
essa cartografia menádica
nunca mais Sá-Carneiro Ana C
as lástimas pedrarias reclusas
vida vitimada por um dicionário
de estética medieval

agora branco tudo
chega do azul do cinza do chumbo
é para sempre que digo fim
a todas as palavrinhas tão românticas
decantadas e sonâmbulas ai
de mim nunca mesmo quero longe
as sãs sacadas as caveiras das
palavras que o desejo poste altivo
se pôs deitado para que morram
este verso este orifício testamento
amaro esta vernacular forma de
cortar a linha que se podia desviar

agora nem também metonímias
multimídia e seus laxantes tabletes
de estar em todo tempo grandes noigandres
lá e cá feiras de poesia gente tocando
trombeta para toda gente lá do
poema lido e decorado e aqui pó
posto como estrume a ceifar fragmentárias
roseiras tempos pós-modernos leseiras
Freud Jung Lacan deixem-me vã
agora nunca mais semióticas cisões
pelos poros da aventura agora nem fadas
nem desusos, nem mitos nem regurgito
à maneira de virtuais pistões


agora inútil emendo a branco
fico muda
besta
,além do mais





20090330

desaparecimentos
- eis a palavra atenciosa
descansada no meu território




(tela a óleo, de Sergio Lucena)

20090213

Evana Komaris






em toda casa um cômodo que acanha
uma criança medonha uma doença da fragilidade
roída para debaixo de nossas alas
em todo quarto o armário sonâmbulo que extravia
a porta a abrir uma porta a fechar
sentados os invictos da masmorra mastigam
a carne assada de um nobre porco silvestre
balbuciando nas faces um desdém interdito
e livre
uma sincera fuga por dentro do garfo
a criança acolhida em suas tranças
que logo serão tolhidas
sabe de todos os jogos e malícias e atua muito bem
por fora de seu espantalho
seu corpo temido e venéreo seu corpo acobertado
com tralhas e bonecas e palavras que não combinavam
com aquele olhar da mãe aquele olhar salubre da família

e só assim eu tento o lastro jubiloso
olhando pelo negativo das caras
aquele meio-fio negro e branco
aquela caricatura de bolhas
ameaçadas dentro das minhas axilas

aquele código que circula
na voz da horrível vida
do sangue

20090211

Memória de Lúcia

fomos atravessadas pelo baldio cheio
destravamos a distância das inadequações
um borrão de vento sopra agora o tímpano
para que o espelho se estilhace sobre o corpo sem retorno

agora tu não me conheces mais
agora tememos o ninguém que nos tocávamos
e todo o dito nos atravessa pelo buraco
do que não foi dito do que nunca poderá
ser dito

de outra maneira como o rio
com um facão na algibeira não havendo mais
lugar
para o cajado da fábula percorrida
nessa passada década de nós

ensaiamos chegar aqui
libertas
esse é o nosso saturno
desfazendo seus anéis translúcidos
sobre nossos pés
aos teus pés
um frio avança desviante
sinto-a em mim
como um trago feito em viagem
uma alucinação calma e
duradoura

sacrificada
em repouso na selvagem
hora
de nossas diferenças









cena de "A Montanha Sagrada", com Leni Riefenstahl