lendo aos poucos, só hoje, Leonardo Martinelli, em seu blog 'má formação'.
cheguei na 'elegia' que ele fez à Ana C., essa que nos plantou para sempre como feitores de elegias dela.
o enigma mágico que plasma na palavra (isso sempre me pasma e me perturba) é que, no caso de Leonardo, a elegia fora também a si mesmo. não te perguntas, quando escreves a próxima elegia de Ana, se aquela não será a tua?
alguns dias depois de postar este poema em seu blog, Leonardo faleceu, com menos de 40 anos.
ressopro a elegia, reelegendo de viés, pelo arroubo, na contramão, seu nome junto de Ana, aquela que nos prostrou a sermos feitores de palimpsestos de sua(s) lápide(s)...
ELEGIA / ACC
de Leonardo Martinelli
Não,
Ana, nem
vem que não
tem: que
há para celebrar?
Teu salto
descalço na piscina
vazia?
As vinte e poucas
edições de tuas
obras
incompletas?
Os poemas
em
tua homenagem,
as mil e
uma teses de mestrado
calcadas
nas entrelinhas
do teu
desespero?
Não, Ana. Esqueça.
Sabe das novas? Armando
vai bem, Eudoro
também, Angela lhe quer
bem, mandou
um beijo
inclusive -
disse que lamenta,
infelizmente
Não
pretende
comparecer ao
enterro
de tua última quimera.
Isso é meio
cruel.
E daí? Foda-se,
Ana C.,
você exaspera
qualquer um
com dúvidas, dívidas
filhos e culhões
com esses ares
de sereia pré-rafaelita
perdida
no Baixo Gávea -
tanto
tesão, meu deus
tanto ardor e
catecismo sex drugs
and rock'n'roll
pra quê
caralho! - tudo
se esvai
num brinde inútil
ao Vazio.
Você não merece nem
um poema frio.
Nem flores de outubro
a teus pés.
Tudo bem, deixa
quieto. Mantenha contato,
o povo daqui
ainda gosta muito
de ti.
Vê se muda de ares -
abraço
Leo
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e uma outra elegia, minha antiga, sempre, é óbvio, dela, Ana ____________________
há um rosto
maciço em mim
o truculento
inviesável
sobre a
borbulha de cuspe e cosmético
pastosa penugem
a critério de
cicatrozes
ingenuamente
feminta
às
segundas-feiras
rompe assim
não faz nada
deixa o dia o
dia ateia
chato fosco
na impune
dó do dia não mexa
ateio
entro-n’água
freixo
que caia dentro
deixo a máscara
derretendo sui-
cílios
céus-surros
quieta afogo
a fogo
a mágoa
amásia
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