20130104

lendo Leonardo Martinelli _______ com ela, a dama elegíaca



lendo aos poucos, só hoje, Leonardo Martinelli, em seu blog 'má formação'.
cheguei na 'elegia' que ele fez à Ana C., essa que nos plantou para sempre como feitores de elegias dela.
o enigma mágico que plasma na palavra (isso sempre me pasma e me perturba) é que, no caso de Leonardo, a elegia fora também a si mesmo. não te perguntas, quando escreves a próxima elegia de Ana, se aquela não será a tua?
alguns dias depois de postar este poema em seu blog, Leonardo faleceu, com menos de 40 anos.
ressopro a elegia, reelegendo de viés, pelo arroubo, na contramão, seu nome junto de Ana, aquela que nos prostrou a sermos feitores de palimpsestos de sua(s) lápide(s)...


ELEGIA / ACC
                             de Leonardo Martinelli

Não,
Ana, nem
vem que não
tem: que
há para celebrar?
Teu salto
descalço na piscina
vazia?
As vinte e poucas
edições de tuas
obras
incompletas?

Os poemas
em
tua homenagem,
as mil e
uma teses de mestrado
calcadas
nas entrelinhas
do teu
desespero?

Não, Ana. Esqueça.
Sabe das novas? Armando
vai bem, Eudoro
também, Angela lhe quer
bem, mandou
um beijo
inclusive -
disse que lamenta,
infelizmente

Não
pretende
comparecer ao
enterro
de tua última quimera.
Isso é meio
cruel.
E daí? Foda-se,
Ana C.,

você exaspera
qualquer um
com dúvidas, dívidas
filhos e culhões
com esses ares
de sereia pré-rafaelita
perdida
no Baixo Gávea -
tanto
tesão, meu deus

tanto ardor e
catecismo sex drugs
and rock'n'roll
pra quê
caralho! - tudo
se esvai
num brinde inútil
ao Vazio.
Você não merece nem
um poema frio.
Nem flores de outubro
a teus pés.

Tudo bem, deixa
quieto. Mantenha contato,
o povo daqui
ainda gosta muito
de ti.
Vê se muda de ares -
abraço

Leo




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e uma outra elegia, minha antiga, sempre, é óbvio, dela, Ana ____________________


ELEGIA

há um rosto maciço em mim
o truculento inviesável
sobre a borbulha de cuspe e cosmético

pastosa penugem
a critério de cicatrozes
ingenuamente feminta

às segundas-feiras
rompe assim
não faz nada
deixa o dia o dia ateia 
chato fosco na impune
dó do dia não mexa 
ateio

entro-n’água
freixo
que caia dentro
 deixo a máscara
derretendo sui-
cílios
céus-surros

quieta afogo
a fogo
a mágoa
amásia



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