20120410

exercício & improviso || [à sylvia, toujours] _ para fernando e lucas, ainda




estamos já com a chuva ao menos

como ela alguma hora paramos de cair

trago a acetona azul para retirar de

dentro das unhas os pedaços enjaulados

da noite anterior, te convido para vir

à rede deitar-se encaixada em mim de revés

e com os pés perto da boca

unhas bem polidas embora rude

a sola você passeia pelas bochechas enquanto abre

janelas até travar, tonta

temo pelos animais que se suicidam sem querer

e pelas crianças que pela necessidade do nada

teus pés muito brancos e finos na parte de cima

pensamos como seria se rasgássemos

essa parede de cal com um salto

azul Yves Klein mas você já sabe que blefo

está tão cinza como antigamente era

hora das mortes

cinematográficas e cinematográficos

enterros com sobretudo choro de rímel e chuva

o orifício do rosto da amante loira

como você, é um blefe e você se dissipa

cansada de brincadeirinhas comigo

está pela casa ainda, não aqui

já o movediço da janela não se altera

a queda é impalpável como coração de mãe

nunca suporíamos que demorasse

menos de um minuto o deslize

do livro até a quadra de futebol

cheia de sacos de lixo não há onde guardá-los

estamos todos devendo algo ao prédio

o livro então suas cartas de aniversário ao menos

se eu pudesse te escreveria uma carta

se eu saísse em viagem usando como pretexto

os papeis sobre a mesa de um café de cais

vendo se repito à letra todas as passagens de Casablanca

convincentemente sexy e azul com pombos e pães

dando em minha boca a palavra amortecida

amor, seria ao menos um espetáculo que não incomodaria ninguém

seria silencioso nem um pio deixo-te um postal

urrando assim legítima a existência de ter que escrever ao menos

isso, mas nem isso, não se tem

que escrever, isso se sabe nem tampouco se quer

escrever:

tua janela com biquíni mares do sul antológica pá de poemas

ninguém esqueceu um detalhe, apenas um detalhe

é ainda sobre São Paulo, muito longe da tua existência

e tão inútil como nunca

abríssemos mais um livro ou outra garrafa


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